Áudio inédito de uma sessão secreta do Superior Tribunal Militar (STM) em 1977, obtido antecipadamente pela Agência Brasil, revela que o ministro Rodrigo Octávio – general que atuou no tribunal até 1979 – diz ter testemunhado um caso de violência em uma unidade do Exército. Os demais membros da Corte negligenciam o assunto e decidem não apurar essa e outras denúncias semelhantes.
A gravação está no acervo do site Vozes Humanas, lançado nesta sexta-feira (31), no Rio de Janeiro, pelo advogado e pesquisador Fernando Fernandes. Nele, podem ser encontrados arquivos de julgamentos de presos políticos no STM no período entre 1975 e 1979. Tanto os abertos ao público geral, como os secretos, quando só ministros e o Ministério Público participavam.
O caso em destaque é o julgamento da apelação 41.336 (RJ) no dia 2 de março de 1977. Oito estudantes foram acusados em 1974 de integrar o Partido Comunista Brasileiro, lançado à clandestinidade pela ditadura. Eles foram absolvidos em primeira instância em 1976, mas o Ministério Público Militar entrou com recurso contra a decisão. Desde o Ato Institucional Número 2, civis podiam ser processados por crimes políticos na justiça militar. Os réus foram novamente absolvidos em uma votação apertada de 5 a 4 no STM. Mas o que chama a atenção nas conversas entre os ministros é o debate sobre a existência de tortura em instituições militares.
Os réus declararam ter sido obrigados, mediante tortura, a confessar participação em atos ilegais. O ministro Rodrigo Octávio, general do Exército, defendeu a apuração das denúncias. Os abusos relatados pelas vítimas incluíam choques elétricos, agressões físicas e psicológicas, e um relato específico de violência sexual da estudante Selma Martins de Oliveira e Silva. Um dos ministros tenta minimizar o fato com um eufemismo recorrente nos julgamentos do STM.
Ministro Augusto Fragoso: Não há problema em tortura, fala em coação, não é? Não é? Em coação?
Ministro Rodrigo Octávio: Falou (…) violência sexual.
Ministro Augusto Fragoso: Através de coação, coação.
Um outro ministro, que não pode ser identificado no áudio, ao defender que o Exército não compactuava com esse tipo de prática, foi interrompido por Rodrigo Octávio.
Ministro não identificado: “Eu não acredito em tortura na sala de…”.
Ministro Rodrigo Octávio: “Bom, eu não posso deixar de acreditar ou não acreditar. Porque eu vi, eu vi uma moça estirada na Aeronáutica, levada para a Polícia do Exército e (…) o Ministro do Exército lá, vendo. O General Cordeiro escreveu uma carta a mim. Cinco folhas. Eu li aqui no Tribunal. Então, isso existe. Isso existe”.
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