Em um muro da favela do Cantagalo, no Rio de Janeiro, o grafite mostra uma mulher carregando uma lata na cabeça. Lembrança dos tempos em que não havia abastecimento de água e cada um se virava como podia. Um pouco mais à frente, já na favela do Pavãozinho, a imagem é de cinco policiais sisudos. Houve uma época em que eles vigiavam os moradores que eram proibidos de construir casas de alvenaria. E, com um pouco mais de fôlego, chega-se à casa no Pavão com referências às brincadeiras das crianças na comunidade: bola de gude, pipa e amarelinha.
Esta é a descrição da visita a um museu. Não é um daqueles tradicionais, com pinturas de artistas renascentistas ou artefatos arqueológicos, mas, ainda assim, um museu. No acervo, casas, muros, ruas, cerca de 20 mil moradores e o modo de vida deles. O Museu de Favela é uma das organizações que compõem a Rede de Museologia Social do Rio de Janeiro, grupo que completa 10 anos em 2023. A rede defende um conceito mais abrangente de museu, incluindo espaços de memória, experiências coletivas e ações voltadas para educação, entretenimento e conhecimento.
Fazem parte da rede os museus da Maré, Sankofa da Rocinha, do Horto, o da Arte e da Cultura Urbana e o Ecomuseu Rural de Barra Alegre. Em encontros mensais, há troca de experiências sobre as comunidades e os movimentos sociais que representam. Para o grupo, a memória é um fator de inclusão e transformação social. Por isso, o objetivo é ampliar a diversidade de vozes e narrativas históricas da sociedade.
“Os museus tradicionais partiam de uma perspectiva distante em relação ao outro. Quando falavam de povos indígenas, quilombos e favelas, sempre falavam em terceira pessoa. A museologia social traz uma experiência na primeira pessoa do singular e do plural. São museus comunitários que falam sobre si mesmos e rompem com qualquer intermediação. Não precisam de alguém que fale por eles”, explica o museólogo, poeta e diretor do Museu da República Mario Chagas, que é membro da rede.
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