O programa Bolsa Família tem efeitos positivos na economia dos municípios, onde movimenta o comércio e impulsiona o consumo de alimentos, roupas e produtos de higiene. O impacto é positivo também em termos de emprego, afirmou nesta terça-feira (26) Joana Silva, economista sênior do Banco Mundial (Bird), durante o seminário Bolsa Família 2.0: Garantia de Renda e Mobilidade Social, promovido pelo Ministério do Desenvolvimento Social, na sede da Fundação Getulio Vargas, no Rio.
Joana Silva disse que o Bolsa Família é um dos maiores programas de assistência à pobreza do mundo, que, mesmo não sendo um direito adquirido, tem características predeterminadas. De maneira geral, os municípios que receberam mais pagamentos do programa tiveram crescimento maior do emprego formal, com maioria de postos de trabalho no setor privado e salário de até dois mínimos, obtidos por pessoas com ensino fundamental completo. O aumento do emprego formal, entretanto, predominou entre não beneficiários do Bolsa Família (64%), com expansão de vagas no setor de serviços. Não houve aumento de salários ou de preços, nem realocação de empregos entre municípios, acrescentou.
Conforme estudos, dois terços de gastos dos beneficiários são feitos em lojas formais e 54%, em serviços. Entre os efeitos causais do programa, Joana Silva citou o custo direto do emprego formal, que alcança US$ 5.131, impactando com 2,16% no Produto Interno Bruto (PIB) local. Em comparação com outros programas para apoio à pobreza no mundo, o Bolsa Família tem valor marginal de fundo público acima da média internacional.
Entre as conclusões, destacam-se as que consideram a iniciativa eficiente como política e com efeito muito positivo sobre o emprego formal. Além isso, os municípios com mais emprego cresceram mais. “É o melhor programa que existe no Brasil”, disse a economista. O estudo confirma que, “além de combater a pobreza, os efeitos multiplicadores do programa pelo estímulo que dá à demanda local e ao emprego, inclusive de não beneficiários, ajudam a aliviar os constrangimentos do lado da demanda que limitam o crescimento econômico.”
Primeira geração
Durante o seminário, o professor Valdemar Neto, da Escola Brasileira de Economia e Finanças da FGV, apresentou o estudo Mobilidade Social no Brasil: Uma Análise da Primeira Geração de Beneficiários do Programa Bolsa Família, com foco em crianças que tinham de 7 a 16 anos de idade em dezembro de 2005, um ano depois do lançamento do programa, em janeiro de 2004. O objetivo foi verificar se essas pessoas, 14 anos depois, haviam saído do programa, se estavam no mercado formal e se houve transferência imediata de renda.
Com base em dados administrativos, foram analisados dois indicadores: emancipação futura de programas sociais do governo federal e entrada no mercado formal de trabalho. Os resultados apurados mostram que, em 2019, 20% desses menores que eram dependentes do Bolsa Família 2005, agora com idade entre 21 e 30 anos, permaneciam como beneficiários, como membros de uma família que recebe o benefício ou como titulares deste, enquanto 64% encontravam-se fora do Cadastro Único (CadÚnico).
Os resultados são indicativos de uma relativa mobilidade social na base da distribuição de renda do Brasil para os beneficiários do Bolsa Família. Em termos da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS), que é um relatório com dados socioeconômicas solicitado pelo Ministério do Trabalho e Emprego brasileiro a pessoas jurídicas e outros empregadores anualmente, o estudo mostra que dos 11,628 milhões de crianças que tinham entre 7 e 16 anos, em 2005, 6,433 milhões não foram encontrados na RAIS em 2019. Isso pode indicar que 44,7% dessas pessoas acessaram o mercado formal de trabalho ao menos uma vez entre os anos de 2015 e 2019. “Houve uma mobilidade relevante para as pessoas em situação de vulnerabilidade. Tenho certeza [de] que impactou consideravelmente a vida deles, mas a gente tem que olhar até onde quer chegar. Os resultados apresentados acabam dando algumas possíveis diretrizes”, disse Valdemar Neto.
A análise por regiões revela que o emprego permanente predomina no Sudeste e no Sul. No Norte e Nordeste, o percentual dos que permanecem por cinco anos na RAIS é menor. Do mesmo modo, a entrada no setor formal de trabalho é menor no Norte e no Nordeste e vai aumentando na medida em que se caminha para o Centro-Oeste, o Sudeste e o Sul.
Na comparação entre beneficiários e não beneficiários que estão na RAIS, verifica-se que, em termos de perfil educacional, o primeiro grupo tem ensino fundamental completo e o segundo, nível de educação maior. O mesmo ocorre em termos de salário. O grupo de pessoas que receberam Bolsa Família está empregado, mas recebe entre 1 e 1,5 salário mínimo. Entre os não beneficiários em 2005, os salários são maiores.
Em outro recorte do estudo, verifica-se que o emprego de menor qualidade concentra-se entre os que recebiam o auxílio em 2005. Nesse grupo, os empregos são também concentrados em empresas de menor porte. Na outra ponta, os não beneficiários têm mais garantias no emprego por estarem em empresas de maior porte no Brasil, que dão mais segurança ao trabalhador do que empresas pequenas, destacou Valdemar Neto.
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