As restrições e tributações da União Europeia quanto à emissão de carbono podem causar um impacto negativo na economia brasileira. O Brasil pode perder até US$ 444,3 milhões com exportações, o que corresponde a quase R$ 2,2 bilhões. O motivo é o mecanismo de ajuste de carbono na fronteira, o CBAM, que vai taxar produtos com emissões de carbono elevadas. Um outro ponto é que as empresas brasileiras que exportam para o bloco europeu deverão rastrear e declarar as emissões de carbono em suas produções. Caso contrário, correm o risco de perder seus parceiros de negócios.
A projeção é de um estudo divulgado pela WayCarbon em parceria com a Câmara de Comércio Internacional (ICC Brasil). O estudo afirma que as exportações de diversos produtos para a União Europeia sofrerão com o mecanismo. As produções de ferro, aço, alumínio, fertilizantes, cimento, eletricidade e hidrogênio estão entre as que devem ser mais impactadas.
A União Europeia tem como metas reduzir as emissões de carbono em 55% até 2030 — em relação a 1990 — e alcançar a neutralidade de carbono até 2050. Os países do bloco estão sujeitos ao Regime de Comércio de Licenças de Emissão — que estabelece um teto para as emissões de gases de efeito estufa. Assim, o CBAM quer taxar e restringir produtos importados de países que não apliquem medidas semelhantes, a fim de aumentar a isonomia em relação aos produtores do bloco europeu que devem obedecer às regras mais rígidas.
Segundo a WayCarbon, atualmente, muitas licenças gratuitas são emitidas para evitar que as empresas europeias tenham sua competitividade prejudicada por produtos importados que não estão sujeitos às mesmas regras de taxação de carbono. Dessa forma, o CBAM surge para que a União Europeia possa eliminar gradualmente as licenças gratuitas sem correr o risco de que as empresas europeias transfiram sua produção para países com menos restrições ambientais. A fase de transição teve início em 2023 e o CBAM entra em vigor em 2026.
Especializada em soluções voltadas à economia de baixo carbono, a WayCarbon defende que é necessário regular o mercado de carbono brasileiro para proteger o país dos efeitos do CBAM e aumentar a competitividade do Brasil. Ainda segundo o levantamento, apesar de a pegada de carbono nos produtos nacionais ser inferior à média global, a regulação do mercado é fundamental para manter a competitividade.
Regulação
Segundo a The Nature Conservancy Brasil (TNC), a regulação assegura as vantagens que o país tem e garante segurança jurídica. A diretora de Políticas Públicas e Relações Governamentais da entidade, Karen Oliveira, explica que o mercado regulado é aquele em que o governo determina um limite de emissão por setores. Assim, se o teto estabelecido a um setor é de mil toneladas de carbono, o excedente a isso emitido na atmosfera deverá ser compensado.
“Se regulado, você cria um ambiente de negócio mais favorável porque aí você tem o estabelecimento de limites de emissão, o que também ajuda a evitar uma especulação sobre o valor desse crédito de carbono e associa a ele boas práticas no processo de negociação. A regulação também traz mais competitividade para o país, já que muitos países que compram os produtos brasileiros já têm políticas de precificação de carbono. Então, se o Brasil tem esse mercado regulado também, isso traz um valor agregado ao nosso produto que pode também facilitar as nossas exportações”, afirma.
O Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) também defende uma legislação sobre o tema. Segundo o diretor-executivo do Ipam, André Guimarães, atualmente, acontecem transações de crédito de carbono no chamado mercado voluntário, em que o setor privado compra e vende o crédito em uma relação bilateral.
“Até estão acontecendo transações, mas elas são pequenas, pontuais e de altíssimo risco, porque pode ser que a lei posterior não permita que essas transações aconteçam. Então, para que a gente possa no Brasil realizar o potencial que a gente tem de entrada nos mercados de carbono globais, inclusive, a gente tem que consolidar o nosso mercado interno. Para isso, uma legislação é fundamental”, destaca.
Mercado brasileiro
Segundo nota técnica elaborada pela consultoria legislativa da Câmara dos Deputados, a criação do mercado regulado de carbono é uma oportunidade para fortalecer a competitividade brasileira no mercado internacional, já que 48% da matriz energética brasileira tem participação de fontes renováveis — 83% se considerada apenas a matriz elétrica. Os números são favoráveis quando comparados às médias mundiais, de 15% e 29% respectivamente, o que se traduz em emissões menores. Além disso, esse mercado deve contribuir para o Brasil cumprir compromissos climáticos.
A regulação do mercado de carbono tem avançado em vários países. A nota traz informações do Banco Mundial que apontam 73 iniciativas de precificação de carbono no mundo até setembro de 2023. “Esta precificação implica custos que são arcados pelos setores produtivos destes países e repassados aos seus consumidores. Esses produtores reagem à concorrência vinda de outros países sem precificação de carbono, pressionando os governos dos seus próprios países a implementarem medidas por uma concorrência em condições mais favoráveis”, diz o documento.
Além da União Europeia, Estados Unidos, Canadá, Japão e Reino Unido avançam no propósito de criar seus próprios mecanismos de ajuste na fronteira.
Projeto em tramitação
A Câmara dos Deputados aprovou, em dezembro de 2023, o projeto de lei que regulamenta o mercado de carbono no Brasil (PL 2148/2015). O objetivo é reduzir as emissões de gases de efeito estufa (GEE) para cumprir a Política Nacional de Mudanças Climáticas e os compromissos climáticos internacionais do país. O texto deve ser, novamente, analisado em 2024.
Entre outros pontos, o projeto cria um sistema que transforma as emissões de carbono em ativos negociáveis, atribuindo um valor econômico. Assim, fica estabelecido um incentivo financeiro para reduzir as emissões. De acordo com o texto, estarão sujeitos à regulação os operadores que emitirem acima de 10 mil toneladas de gás carbônico por ano.
Fonte: Brasil61