Por determinação do ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), todas as emendas impositivas apresentadas por deputados federais e senadores ao orçamento da União foram suspensas. Pela decisão, a suspensão permanece até que os poderes Legislativo e Executivo criem novas medidas para que a liberação dos recursos siga requisitos de transparência e rastreabilidade.
A decisão liminar foi tomada na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7697 e ressalva, porém, que a execução das emendas pode continuar em caso de obras em andamento e de calamidade pública.
O economista Gilberto Braga avalia que a medida do STF, do ponto de vista econômico, é de governança corporativa pública, de transparência e de valorização do recurso público. Ele indica, ainda, que é esperado o desconforto do Congresso a respeito da decisão. “O embate não é técnico, é político”, opina.
Braga ressalta que a decisão do STF é básica e relevante para o orçamento público. “A medida do Supremo Tribunal Federal é na direção de se exigir do parlamento que estabeleça o mínimo de conformidade na alocação dos recursos das emendas, indicando-se com clareza e identificação onde será alocada e prestar contas sobre o seu uso. Trata-se de uma medida básica e indispensável para com o orçamento público.”
Já o especialista em orçamento público, César Lima, destaca que apoia as medidas de transparência no repasse dos recursos, mas avalia a decisão do ministro Flávio Dino como controversa. Segundo Lima, já existem procedimentos de rastreabilidade e checagem de transparência das emendas impositivas.
“Se formos pensar em termos das emendas impositivas, tanto as estaduais quanto as impositivas individuais, todas elas têm transparência, são rastreáveis, estão no Ciaf, estão no Tesouro Transparente, tem como você olhar no CIOP, tem como olhar no portal da transparência. Então, assim, não sei os termos exatos ou quem foi que auxiliou o ministro nesse sentido, mas creio que ele está equivocado”, pontua Lima.
César Lima aponta que o objetivo da Emenda de Transferência Especial é “sair dos trâmites altamente burocráticos que existem hoje no governo federal nos instrumentos para repasse de verbas”. Segundo Lima, a dificuldade para aprovar projetos para realização de obras pode levar até um ano o que, para ele, traz prejuízos à população dos municípios.
“Acho que o que tem que ser revisto para poder minimizar essa coisa da utilização de Emenda de Transferência Especial é a burocracia hoje utilizada para a confecção dos instrumentos de repasse de transferências voluntárias”, salienta Lima.
A ação do STF foi motivada por uma ação protocolada na Corte pelo PSOL, que alegou que o modelo de emendas impositivas individuais e de bancada de parlamentares impossibilitava o controle dos gastos de forma preventiva.
Entenda o que são emendas impositivas
As emendas impositivas são previstas na Constituição Federal e são emendas propostas por deputados, senadores e bancadas federais de cada estado que permitem fazer transferências financeiras de recursos federais existentes no orçamento público para estados e municípios.
As chamadas emendas impositivas são todas as emendas individuais de transferência especial (PIX), emendas individuais de transferência com finalidade definida e emendas de bancadas. Segundo o César Lima, emendas de finalidade devem ter convênio, como forma de instrumento para o repasse do dinheiro.
“As transferências especiais que entram no caixa das prefeituras como um recurso financeiro podem financiar qualquer ação que esteja na lei orçamentária da prefeitura. Não pode fazer qualquer coisa também. Essas emendas de transferência especial que o povo chama de PIX, elas têm que ter no mínimo 70% do seu uso para investimentos, para obras, para ampliação, construção e aí pode ser de escola, de hospital, não tem uma amarração nesse caso. E somente 30% pode ser para custeio, sendo que a prefeitura não pode pagar a sua dívida com esses recursos”, explica Lima.
As emendas Pix surgiram em 2019 para eliminar a necessidade de convênios para o repasse de recursos, com vistas a dar mais agilidade à execução.
O economista Gilberto Braga explica que os parlamentares indicam projetos para aplicação dos recursos públicos, processo que pode resultar na ausência de transparência nos repasses.
“Os parlamentares escolhem e indicam os projetos para os quais os recursos públicos deverão ser alocados, mas cabe aos governadores e prefeitos utilizarem essa verba, o que acaba permitindo que o dinheiro possa ser gasto sem a completa transparência e prestação de contas”, avalia Braga.
Posicionamento do Congresso
Uma nota técnica publicada por consultores de Orçamento da Câmara dos Deputados a pedido do partido Novo salienta que a ação faz com que os recursos fiquem sob a responsabilidade da União em relação à execução e à fiscalização. Ou seja, segundo os consultores, ficará com a União a responsabilidade de tomar medidas caso não seja comprovada a aplicação dos recursos.
A Câmara dos Deputados, o Senado Federal e dez partidos políticos apresentaram ao STF um pedido de suspensão das decisões do ministro Flávio Dino. No texto, o Congresso questiona a legalidade e a constitucionalidade dos atos do ministro. Além disso, menciona que as decisões foram tomadas fora de contexto de urgência.