Um grande depósito de potássio off shore, localizado próximo à costa no estado de Sergipe, poderá dar ao Brasil a autossuficiência no suprimento de cloreto de potássio, do qual o País é altamente dependente de importações.
Trata-se de uma área pertencente à empresa South Atlantic Potash, liderada pelo experiente engenheiro de minas e empresário Antenor Firmino Silva Júnior, onde existem extensas camadas de sais – cloreto de potássio e cloreto de sódio, situadas acima da camada do Pré-sal.
Os recursos potenciais foram estimados em mais de 3 bilhões de toneladas de KCl. A expectativa é que o projeto possa alcançar uma produção de 2 milhões t/ano de cloreto de potássio já no curto prazo.
Para estudar a viabilidade da exploração offshore a South Atlantic Potash contratou a empresa canadense Wood, especializada em petróleo e solution mining, com projetos bem sucedidos no Canadá, que está trabalhando com os brasileiros Luís Albano Tondo e Luiz Augusto Bizzi em um estudo de pré-viabilidade que deve ser concluído ainda este ano.
O projeto de Sergipe, segundo Antenor Silva Júnior, tem origem em 2010, quando a então MbAC se dedicava a projetos de fertilizantes e identificou a oportunidade de exploração de potássio em áreas do Pré-sal. “Como se sabe, o petróleo do Pré-sal está abaixo de extensas camadas de sal, que incluem cloreto de potássio. Na época, pensamos: por que a MbAC não exploraria esse potássio, já que era uma empresa de fertilizantes?”, diz ele.
Para estudar a possibilidade de produção de potássio no Pré-sal, a AMEC foi contratada em 2010 para fazer um estudo conceitual e chegou à conclusão de que era viável implantar uma lavra por solução, semelhante ao que é feito no Canadá, bombeando a solução salina até a costa onde seria processada em uma planta convencional em terra firme.
Foram consideradas, na época, três áreas: algumas ocorrências próximas à costa de Sergipe e do Espírito Santo, e uma terceira em São Paulo (esta última com espessas camadas de KCl mas situada a cerca de 100km da costa).
A conclusão do estudo da AMEC foi que o projeto era viável técnica e economicamente. No caso das jazidas próximas à costa, a planta para processar os sais de potássio seria igual àquelas utilizadas no Canadá, independentemente da área, e apenas a parte de produção em plataforma de água rasa apresentaria maiores riscos. No caso das jazidas mais distantes da costa, todo o processamento teria que ser feito embarcado, que é mais arriscado e oneroso.
“Se fosse feito um projeto próximo à costa, que é o caso de Sergipe, poderia ser um meio termo: se lavrava os sais no mar e se processava na costa. Esta foi a alternativa que apresentou a melhor viabilidade. O projeto era viável, o NPV era positivo e a taxa de retorno competitiva, mas o investimento seria de US$ 2,5 bilhões. Foram estudadas duas escalas: 1 milhão de toneladas/ano e 2 milhões t/ano. Na época, as duas escalas foram consideradas viáveis técnica e economicamente.”
Entretanto, afirma Antenor, o projeto era muito grande para o tamanho da MbAC. O projeto de potássio não foi em frente, principalmente devido ao custo dos materiais, que era muito alto na época.
Desde 2010, a dependência do Brasil de importações de potássio aumentou e foram desenvolvidos novos materiais para operação off shore, de custo bem mais baixo, o que impactou positivamente a economicidade do projeto.
Diante dessa nova realidade, foi criada a South Atlantic Potash, contratou-se a Wood (sucessora da AMEC) para estudos complementares e o projeto entrou em uma nova fase. Partiu-se do modelo conceitual preparado anteriormente e estuda-se agora um caso concreto de viabilidade para a explotação de potássio utilizando dados, informações e infraestrutura já existentes na região.
Um outro fator importante é que o preço internacional do potássio tem se mantido relativamente estável, com momentos de pico. “O potássio tem a peculiaridade de ser um produto geopolítico. Qualquer problema político faz o preço disparar, mas quando as coisas se assentam, ele volta ao normal”, observa Antenor.
De acordo com Luís Albano, a área-alvo na costa de Sergipe está coberta por direitos minerários da South Atlantic Potash. Para estudar o potencial dos recursos utilizaram-se furos e dados de geofísica 2D e 3D produzidos pela Petrobras na busca por petróleo. Os perfis digitais e de geofísica foram utilizados usando tecnologia padrão do mercado para a identificação e definição dos teores de KCl nas camadas intercaladas de halita, silvita e silvinita.
Ele acrescenta que algumas plataformas da Petrobras estão em fase de descomissionamento e que a South Atlantic Potash estuda a possibilidade de aproveitar não só plataformas mas também infraestrutura e tubulações usadas para a produção de petróleo, o que pode reduzir a demanda de capital do projeto.
“Uma das vantagens da área de Sergipe é a proximidade da costa, que é de aproximadamente 15km. Além disso, as águas são bastante rasas, com profundidade média do mar de 26 metros, o que facilita e reduz os custos operacionais. Ele explica que, para a extração do potássio, primeiro será feito um poço pioneiro a partir de uma plataforma. Em seguida, devem ser perfurados até 40 novos poços através de sondagem direcional para a formação de cavernas de produção. Para cada caverna formada serão necessários dois poços: um de injeção de água aquecida e outro de extração dos sais. Como se trata de sal, pode-se fazer uma dissolução de forma bastante controlada. Os parâmetros a serem controlados são a temperatura do fluido (que no caso é água do mar), a pressão e a concentração de sais na água. “Por exemplo, se quiser ser mais seletivo e dissolver só o KCl (cloreto de potássio) e não tanto o NaCl (cloreto de sódio), injeta-se uma salmoura com alta concentração de NaCl, evitando dissolver o NaCl e dissolvendo somente o KCl. Com isso, se consegue chegar à concentração que é necessária para o processo. A salmoura é bombeada para a planta, em terra firme, e alí se faz a separação real entre o KCl e o NaCl através de um processo convencional de evaporação e cristalização.
O método é inovador, no sentido de que nunca foi feito off shore. Geralmente é feito on-shore”, detalha. Ele acrescenta que o projeto tem vantagens do ponto de vista social e ambiental. Social, porque não há comunidades diretamente impactadas pela lavra; e ambiental, porque a lavra de minério mais profundo e em área coberta por água do mar não acarreta os problemas de subsidência observados quando a lavra por solução é executada em terra.
“No caso de Sergipe, como a camada é muito profunda, relativamente delgada e muito extensa, os efeitos de subsidência são imperceptíveis. De qualquer forma, é feito um controle das cavernas para não haver subsidência. Além disso, pretende-se reinjetar a própria salmoura e assim o NaCl fica preenchendo as cavidades, para evitar eventual subsidência”.
Luís Albano informa que as cavernas terão uma distância de 130m a 150m entre si, para que haja pilares de sustentação e seja mantida a estrutura da rocha no local. Ele acrescenta que já existem na área mais de 150 poços que foram perfurados pela Petrobras, dos quais cerca de 80 atravessam as camadas de sais.
Outra grande vantagem do projeto é sua escalabilidade, porque a camada se estende por quilômetros de distância. “Só na região onde estamos, podemos ter mais de 3 bilhões de toneladas de KCl. Pretendemos começar com 2 milhões t/ano, o que vai exigir três plataformas operando simultaneamente, mas a produção pode ser dobrada a cada poucos anos.”
Outro ponto positivo é que projeto também permite o aproveitamento do cloreto de sódio. O NaCl que vai ser produzido terá grau de pureza industrial, diferentemente do sal da água do mar, que vem com contaminantes. “O cloreto de sódio é vendável e há mercado para isso. A própria Braskem, com o problema de Maceió (afundamento de zona urbana), não produz NaCl desde 2018 e está importando do Chile. Portanto, há um mercado consumidor favorável”, informa Luís Albano. Para cada tonelada de KCl produzida, são produzidas 1,3 toneladas de NaCl. “Acreditamos ser possível desenvolver esse mercado, porque hoje se está importando esse sal de melhor qualidade para fabricação de soda cáustica. Isso também vai agregar valor ao projeto”, diz o engenheiro.
Segundo Luiz Bizzi, a grande profundidade das camadas de sal favorece a lavra por solução. “No Canadá, as empresas que fazem a lavra subterrânea estão lavrando a profundidades de 1.000m a 1.200m, e quem faz a lavra por solução opera a profundidades maiores. Aprendemos com a Wood que para fazer a lavra por solução, o ideal são profundidades maiores do que 2.000m. Nosso minério está a 2.500 metros de profundidade, e quanto mais profundo, melhor, podendo-se usar técnicas semelhantes àquelas de extração de petróleo por fracking e contando com a pressão litostática que ajuda no sentido de levar a solução saturada em KCl para a superfície. Outro aspecto é que, à medida que aumenta a profundidade a solução salina fica mais quente, o que favorece a solubilidade e, portanto, a recuperação dos sais de potássio.
“Então a nossa salmoura, por estar a maior profundidade, está naturalmente aquecida. Portanto, a profundidade das camadas é algo favorável”, conclui Bizzi. (Por Francisco Alves)